Considerando o ritmo de crescimento das cidades (no Brasil, oito em cada dez habitantes vivem em centros urbanos), ficamos sempre apreensivos com a qualidade desse desenvolvimento.  Os desafios relativos ao trabalho, meio ambiente, saneamento básico, habitação, mobilidade, segurança pública, educação e saúde fazem parte do dia a dia dos administradores e as diretrizes que forem por eles adotadas selarão o futuro daquela comunidade.

Recente artigo publicado pelo jornal O Estado de S. Paulo me chamou a atenção para um projeto, que reputo um dos mais relevantes na questão de planejamento e entrosamento da iniciativa privada com o poder público e uma referência no que diz respeito a soluções de revitalização urbana. Trata-se do Ground Zero (Marco Zero), em Lower Manhattan,  Nova York, EUA, onde se localizava o complexo do World Trade Center.

Difícil esquecer o atentado de 11 de setembro de 2001, que sentenciou à morte milhares de pessoas e destruiu as duas torres gêmeas, símbolos do espírito empreendedor americano. Passados 12 anos, hoje vemos no local o resultado da engenharia, inovação, perseverança e superação do espírito humano. No local onde antes estavam as “twin towers” – uma área de 65 mil m2, inferior, portanto, a do clube Pinheiros, em São Paulo –, foram projetadas cinco novas torres, com mais de um milhão de metros quadrados de escritório, um shopping mall subterrâneo, um centro de artes com mais de mil lugares, um museu, o memorial em lembrança das vítimas e uma central de transportes. Estimativas do investimento total do projeto, quando concluído, apontam para algo em torno de US$15 bilhões.

A primeira torre – WTC 1 ou Freedom Tower, como foi apelidada – tem 104 andares e será o prédio mais alto de Nova York. A um custo previsto de US$ 3,8 bilhões e com a expectativa de ser concluída em meados de 2013, o edifício, sozinho, aportará 250 mil m2 de espaço para escritórios. Mas, então, perguntamos: quantas pessoas vão trabalhar no local se essa torre, somada aos 88 andares da torre 2, os 71 andares da torre 3, os 61 andares da torre 4 e mais a torre 5 resultarão em mais de 1 milhão de metros quadrados de escritórios? Se adotarmos 15 m2 de escritório para cada profissional, chegaremos a 66 mil pessoas, equivalente a uma cidade como Vinhedo (63 mil) ou Amparo (66 mil).  Mas, pior, quantas vagas de garagem serão necessárias para atender a esse contingente? Pelo padrão brasileiro de prédios comerciais “triple A” (35 metros de escritório para cada vaga) seriam necessárias aproximadamente 28,5 mil garagens, só para o complexo de escritórios, sem contar os demais equipamentos culturais. Um número inviável! Ai é que entra a grande virtude do planejamento. A primeira torre, com 250 mil m2 de escritório, não possui mais do que 120 vagas de garagem – ou seja, todos chegarão a seu destino via transporte público. Mas no local também foi projetada uma central de transporte com grandeza similar a da Grand Central Station (maior estação de trens da cidade de Nova York) que permitirá tráfego de 200 mil pessoas por dia.  Vale dizer, podemos, sim, crescer, desde que a infraestrutura urbana, principalmente a de mobilidade, nos acompanhe de mãos dadas.

Assim, certas estão nossas administrações estaduais e municipais em investir pesadamente no transporte coletivo, pois estão sendo projetados para a cidade de São Paulo novos milhões de metros quadrados de escritório, sem contar outros investimentos em equipamentos comerciais e residenciais – evidentemente, não teremos capacidade viária para suportar a atual proporção/correlação exigida de vagas por m2 de escritórios/comercial/residencial.  O crescimento é saudável, pois atende as necessidades do ser humano de emprego, renda, cultura, inovação etc., mas exige-se que seja planejado para que tenhamos histórias interessantes, como esta, para contar.